Ribeirada - Poema num só canto
Argumento
Quando o preto Ribeiro entregue ao sono
Jazia, aparece-lhe o deus Priapo; (deus grego da fertilidade)
E com uma das mãos por ser fanchono, (homossexual, gay)
Agarra-lhe na cabeça do marsapo; (caralho)
Oferece-lhe depois um belo cono,
Cono sem cavalete, gordo e guapo;
Casa o preto mas a mulher, no fim de contas,
Põe-lhe na testa retorcidas pontas.
Canto Único
Ações famosas do fodaz Ribeiro,
Preto na cara, enorme no mangalho,
Eu pretendo cantar em tom grosseiro,
Se a musa me ajudar neste trabalho;
Pasme absorto escutando o mundo inteiro
A porca descrição do horrendo malho,
Que entre as pernas alberga o negro bruto
No lascivo apetite dissoluto.
Oh! Musa galicada e fedorenta! (que tem sífilis)
Tu, que às fodas de Apolo estás sujeita,
Anima a minha voz, pois hoje intenta
Cantar esse mangaz, que a tudo arreita; (fode)
Desse vaso carnal que o membro aquenta,
Onde tanta langonha se aproveita,
Um chorrilho me dá, oh musa obscena,
Que eu com rijo tesão pego na pena.
Em Troia, de Setúbal, bairro inculto,
Mora o preto castiço, de quem falo;
Cujo nervo é de sorte, e tem tal vulto,
Que excede o longo espeto de um cavalo;
Sem querer nos calções estar oculto,
Quando se entesa o túmido badalo,
Ora arranca os botões com fúria rija,
Ora arromba as paredes quando mija.
Adorna hirsuto ríspido pentelho
Os ardentes colhões do bom Ribeiro,
Que são duas maçãs de escaravelho,
Não digo na grandeza, mas no cheiro;
Ali piolhos-ladros tão vermelho
Fazem com dente agudo o pau leiteiro,
Que o cata muita vez; mas ao tocar-lhe
Logo o membro nas mãos entra a pular-lhe.
Os maiores marsapos do universo
À vista deste para trás ficaram;
E do novo Martinho em prosa e verso
Mil poetas a piça descantaram;
Quando ainda o cachorro estava no berço
Umas moças por graça lhe pegaram
Na piça já taluda, e de repente
Pelas mãos lhe correu a grossa enchente.
De Polifemo o nervo dilatado, (um ciclope da mitologia grega)
Que tentou escachar a Galateia, (foder até a arrebentar)
Pelo mundo não deu tão grande brado
Como a piça do preto é negra e feia;
Da Cotovia o bando galicado (nome de um antigo bairro de má reputação de Setúbal)
Com respeito mil vezes o nomeia,
E ao soberbo estardalho do selvagem
As putas todas rendem vassalagem.
O longo e denso véu da noite escura
Das estrelas bordado já se via;
E em rota cama a horrenda criatura
Os tenebrosos membros estendia;
Do caralho a grandíssima estatura
Com os lençóis encobrir-se não podia,
E a cabeça do fodaz de fora pondo
Fazia sobre o chão medonho estrondo.
Os ladros, que fiéis o acompanhavam
A triste colhoada a cada instante
Com agudos ferrões lhe traspassavam,
Atormentando a besta fornicante;
Na duríssima pele se entranhavam,
Suposto que com garra penetrante
O negro dos colhões a muitos saca,
E o castigo lhes dá na fera unhaca.
Tendo o cono patente no sentido
Na barriga o tesão lhe dava murros;
E de activa luxúria enfurecido
Espalhava o cachorro aflitos urros;
Com a lembrança do vaso apetecido
O nariz encrespava como os burros;
Até que em vão berrando pelo cono,
De todo se entregou nas mãos do sono.
Já roncando, os vizinhos acordava
O lascivo animal, que representa
Com o motim pavoroso que formava,
Trovão fero no ar, no mar tormenta;
Com alternados coices espancava
Da pobre cama a roupa fedorenta,
Que pulgas esfaimadas habitavam,
E de mil cagadelas matizavam.
Eis de improviso em sonhos lhe aparece
Terrífica visão, que um braço estende,
E pela grossa carne que lhe cresce
Debaixo da barriga ao negro prende;
Acorda, põe-lhe os olhos, e estremece
Como quem ao terror se curva e rende;
Com o medo que tinha, a piça ingente
Se meteu nas encolhas de repente.
Do tremendo fantasma a testa dura
Dois retorcidos cornos enfeitavam;
E, debaixo da pança, a mata escura
Três disformes caralhos ocupavam;
O sujo aspecto, a feia catadura,
Os rasgados olhões iluminavam;
E na terrível destra o torpe espectro
Empunhava uma piça em vez de ceptro.
Ergue a voz, que as paredes abalava,
E com a força do alento sibilante
Mata a pálida luz, que a um canto estava,
Em plúmbeo castiçal agonizante;
“Oh tu, rei dos caralhos (exclamava)
Perde o medo, que mostras no semblante;
Que quem hoje te agarra no marsapo
É de Vénus o filho, o deus Priapo.
“Vendo a fome cruel de parrameiro*,
Que essas negras entranhas te devora,
De putas um covil deixei ligeiro,
Por fartar-te de fodas sem demora;
Consolarás o rígido madeiro
Numa fêmea gentil, que perto mora,
Mas não lho metas todo, pois receio
Que a possas escachar de meio a meio.”
*(Parrameiro é um doce típico dos açores mas que se faz em várias partes de Portugal. É suposto ter a forma de uma ferradura mas como sempre houve gente que viu na forma do bolo os quadris de uma mulher, “parrameiro” tornou-se calão no século XVIII para essa parte do corpo feminino e até dos próprios órgãos genitais da mulher.)
Disse isto, e o negro na cama velozmente
Para beijar-lhe os pés se levantava;
Mas tropeça num banco, e de repente
No fétido bispote as ventas crava; (penico)
Não ficando da queda mui contente
Com uma gota de mijo à pressa as lava;
E, acabada a limpeza, a voz grosseira
Ao deus falou desta maneira;
“Socorro de famintos fodedores,
Propícia divindade, que me escutas!
Tu consolas, tu enches de favores
Ó mestre da fodenga, ó pai das putas;
Viste que, do tesão curtindo as dores,
Travava com o lençol imensas lutas;
E baixaste ligeiro, como Noto,
A dar piedoso amparo ao teu devoto.
Enquanto houver tesões, e enquanto o cono
For de arreitadas piças lenitivo,
Sempre hei-de recordar-me, alto patrono,
De que és de meus gostos o motivo;
Pois dás-me glória no elevado trono,
E já, como o veado fugitivo
Que o caçador persegue, eu corro, eu corro
A procurar as bordas por quem morro.”
Deteve aqui a voz o rijo acento,
Que dos trovões o estrépito parece,
E logo diante os olhos num momento
A nocturna visão desaparece;
Deixa Ribeiro o sórdido aposento,
Que de antigos escarros se guarnece;
E nas tripas berrando-lhe o demónio
Corre logo a tratar do matrimónio.
O brando coração da fêmea alcança
Com finezas, carícias e desvelos;
A qual sobre a vil cara emprega, e lança
(Tentação do demónio!) os olhos belos;
O fodedor maldito não descansa
Sem ver chegar o dia, em que os marmelos
Que tem juntos do cu, dêem cabeçadas
Entre as cândidas virilhas delicadas.
Chega o dia infeliz (triste badejo!
Mísera crica! Desditoso rabo!)
E ornado o rosto de um purpúreo pejo
Une-se a mão de um anjo à do diabo;
Ardendo o bruto em férvido desejo
Unta de louro azeite o longo nabo,
Para que possa entrar com mais brandura
A vermelha cerviz faminta, e dura.
Começa o banquete, que constava
De dois gatos achados num monturo, (beco ou lixeira)
E de raspas de corno, de que usava
Em lugar de pimenta o preto impuro;
Em sujo frasco ali se divisava
Turva água-pé: fatias de pão duro
Pela mesa decrépita espalhadas
A fraca vida perdem às dentadas.
Depois de ter o esposo o bucho farto,
Abrasado de amor na ardente chama,
Foge com leves passos para o quarto,
Ao colo conduzindo a bela dama;
Pelas ceroulas o voraz lagarto
A genital enxúndia já derrama;
Só por ver da consorte o gesto lindo
Ainda antes de foder já se está vindo!
Jazia o velho tálamo a um canto (o leito nupcial)
Onde de pulgas esquadrão persiste,
Para ser teatro do aflito pranto
Que havia derramar a esposa triste;
Oh noite de terror, noite de espanto,
Que das fodas cruéis o estrago viste!
Permite que com métrica harmonia
Patente ponha tudo à luz do dia.
Ergue-lhe a saia o renegado amante,
Estira-se a consorte ágil e pronta;
E ele a seta carnal no mesmo instante
Ao parrameiro mísero lhe aponta;
Com um só beijo do membro palpipante
Ficou subitamente a moça tonta,
E julgou (tanto em fogo ardia o nabo!)
Que encerrava entre as pernas o diabo.
Prossegue o desalmado; mas a esposa
Que não pode aturar-lhe a dura estaca,
Dando voltas ao cu muito chorosa
Com jeito o membralhão das bordas saca;
Ele irado lhe diz, com voz queixosa;
“Não é uma mulher como uma vaca?
Porque fazes traições, quando te empurro
O mastro? Quando vês que gemo, e zurro?”
Então, cheio de raiva, aperta o dente,
E na gostosa, feminil masmorra,
Alargando-lhe as pernas novamente,
Com estrondosos ais encaixa a porra; (piça; pénis)
Ela, que já no corpo o fogo sente
Do marsapo lhe diz: “Queres que eu morra?
Tu não vez que me engasgo, e que estou rouca,
Porque o cruel tesão me chega à boca?
“Ah! deixa-me tomar um breve alento,
Primeiro que rendida e morta caia...”
Mas ele, na foda é um jumento,
Não tem dó da mulher, que já desmaia;
Sentindo ser chegado o fim do intento,
Do ranhoso licor lhe inunda a saia;
Porque dentro do vaso não cabia
A torrente, que rápida corria.
De gosto o vil cachorro então se baba,
E vendo que a mulher calada fica,
“Consola-te (exclamou) que já se acaba
Esta fome voraz da minha piça.”
E com muita risada se gaba
De lhe ter esfolado a roxa crica;
Mas ela grita, ardendo-lhe o sabugo;
“Ora que casasse eu com um verdugo! (carrasco)
“Fora, fora cachorro, não te aturo
Que me feres as bordas do coninho!”
E com desembaraço um teso e duro
Bofetão lhe arrumou no focinho;
Tomou em tom de graça o monstro escuro
A afrontosa pancada, e com carinho
Disse para a mulher: “Brincas comigo?
Pois torno-te a foder, por castigo.”
Estas vozes ouvindo a desgraçada
De repente no chão cair se deixa;
E, temendo a mortífera estocada,
Ora abre os tristes olhos, ora os fecha;
Com suspiros depois desatinada
Da contrária fortuna ali se queixa;
Até que ele lhe diz, com meigo modo;
“Levanta-te do chão, que não te fodo.”
Alma nova cobrou, como uma lebre aflita,
Que das unhas dos cães se vê liberta;
E apalpando a conaça (oh que desdita!)
Mais que boca de barra a encontra aberta;
Mas consola-se um pouco, e já medita
Em fugir da ruína, que é tão certa;
E em vingar-se do horrível brutamonte,
Ornando-lhe de cornos toda a fronte
.
Tem conseguido a bárbara vingança
A traidora mulher, como queria;
E o negro com a paciência branda e mansa,
Sofrendo os cornos vai de dia em dia;
Bem mostra no que faz não ser criança,
Que de nada o rigor lhe serviria;
Porque se uma mulher quiser perder-se,
Até feita em picado há de foder-se.
Agora vós, fodões encarniçados,
Que julgais agradar às moças belas
Por terdes uns marsapos, que estirados (flácidos)
Vão pregar com os focinhos nas canelas;
Conhecereis aqui desenganados
Que não são tais porrões do gosto delas;
Que lhes não pode, enfim, causar recreio
Aquele que passar de palmo e meio.
Manuel Maria Barbosa du Bocage