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segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

Poesia de primeira, à Segunda-Feira (#04/2016)

Hotel London, quarto 502

Para o Pedro Serpa


I

É estranho que se possa
de repente pensar
que a felicidade consiste
em olhar, desta janela,
para o pátio interior

composto, por sua vez,
de janelas abertas ou fechadas,
sombrias ou com luz,
sob o cinzento vigilante dos telhados.

A beleza - isso que de repente
nos afronta e merecia,
aliás, outro nome - nada
deve agora às «fenêtres» do Pimodan.

Acontece, tão-só, que a cidade
se chama Paris - e a morte,
esta noite, não vencerá.

II

É claro que poderia ter dito
quase exactamente o mesmo
de um modo menos enfático,
desprovido de acenos literários
tão generosos para com
os meus detractores (que são
pessoas sérias, de aura reluzente).

Além do pátio interior e de todas
as janelas, há uma escrivaninha
que me fez sentir a obrigação moral
de um poema, nem que este
dissesse apenas que
hoje - 22 de Julho de 2008 -
estou vivo em Paris
e não quero saber de mais nada.

III

Com um pouco mais de concisão,
chegaria ao ponto de afirmar
que as janelas de Paris
são as que melhor
me fazem esquecer o mundo.

Convém, pois, demonstrar-lhes
a gratidão possível, nem que seja
assinando versos desbotados.

IV

Paris é , tentando uma síntese
derradeira, muito mais real do que
o mundo. Telhados de chumbo
que se despedem, sem regresso.

- por saberem que não há canções.

V

O poema mais interessante, porém,
seria aquele que escreve agora
quem me vê escrever nesta janela
um poema sobre Paris que não existe.


Manuel de Freitas

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