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sábado, 4 de julho de 2015

Cidadão Nemo por Paulo Seara (#01/2015)

Cidadão Nemo
Peça em 1 Acto

Por Paulo Seara



Cena 1 (Medicamentos)


Um terço da luz ilumina o quarto. Na penumbra quase total, um homem dorme, dentro de um enorme fatia de cobertores. O conforto do sono não será perturbado pelo ruído agudo da telefonia? Estará a dormir? Do quanto se consegue vislumbrar o mobiliário enegrecido, com algumas mossas, e cortes na madeira lacada. Há no ar o cheiro da urina; e o bafo retido no cubículo; o cotão com pó que petrifica o chão debaixo da cama. O relógio dispara, que é hora de tomar os comprimidos para adormecer. O homem está alerta, tosse e ergue-se, ilumina a dose habitual e deita-se novamente com os comprimidos se desfazendo nas entranhas. O rádio continua pela madragoa tocando, como se fosse a luz de vigília de crianças.

Monólogo ao tomar os comprimidos

Semedo: Este vou guardar para amanhã e este também, que a vida está cara, e porque preciso de dinheiro para o talho; e comprar as aparas é o que é! (Pausa). São horas … (tosse) … são só mais estes dois, e assim só de amanhã a oito é que compro uma nova caixa … (tosse). (Pausa) E tu vai tocar para a puta que te pariu (desliga o alarme, e volta a deitar-se).

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