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sábado, 13 de dezembro de 2014

Crime Entre Amigos por Paulo Seara

(Se perdeste, algum dos capítulos anteriores de Crime Entre Amigos, ou se os quiseres reler, carrega nas ligações para veres o capítulo respectivo.)

Capítulo I
Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII


Capítulo IX – 25 de Janeiro


Era fim-de-semana, uma sexta-feira dolente atravessou-lhe o corpo. Agora não precisava de ter pressa, o tempo e as pressões jogavam a seu favor. Quando regressou do emprego arrastou-se para o sofá e ficou a meditar. De vez em quando ia ao bolso das calças tactear o metal da chave do templo, que copiara recentemente; e imaginava o devir naquela noite. Rogério resolveu sair depois do jantar, voltaria brevemente conforme prometera, era só ir a uma aldeia vizinha tratar de pagar uma dívida da casa. À mulher pouco lhe importava.

Com a noite por gabardine envolveu-se nos nevoeiros de Janeiro e foi até ao santuário. Era necessário garantir, apesar da facilidade do assalto, o silêncio e a discrição. Andou por todo o ermo, e não encontrou ninguém, muito menos o automóvel que pôs em fuga.

Foi à algibeira, quando se aproximava da porta lateral do templo, e retirou a chave. Foi breve; e estava feliz por não precisar de mais apetrechos, como machadas, que depois desapareciam. Bastavam-lhe a chave, as luvas e uma lanterna. Apenas cinco passos, pensava metonímicamente, apenas cinco passos; e no regresso mudaria a sua vida. Entrou e foi directo a um altar lateral. Pensou em todas as jogadas do passado, para obter a santinha da idade média, e imaginou o seu ventre grávido de jóias, nas suas mãos. Pensou em quando sentado junto ao televisor, revolvia os planos vistos e revistos antes da primeira tentativa. Enfim, agarrou o que lhe parecera inacessível. A santa pertencia-lhe – ele, o conquistador de novos tesouros mouriscos. Num relâmpago, desapareceu com a figura debaixo do casaco. Seguiu de imediato para a aldeia vizinha, cumprindo o álibi. Pelo caminho transfigurava-se com a facilidade com que tudo acontecera. Um sorriso criminal afundando-se-lhe  na cara. No próximo dia chegaria Edmundo, e juntos abririam a santa. Mas Rogério não deixou de abanar a figura, e confirmou-se que havia algo que sacudia, e sentiu-se trespassado pela satisfação do dever cumprido.

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