Capítulo I
Capítulo II
Capítulo III
Capítulo IV
Capítulo V
Capítulo VI
Capítulo VII
Capítulo VIII
Capítulo X – 26 de Janeiro
Encontraram-se os dois na garagem, e prepararam-se
para confirmar o mito com as suas mãos. Na parte inferior da Santa uma pequena
saliência deu-lhes as primeiras boas notícias. Algo insistentes, os esforços
dos dois amigos, conseguiram chegar ao momento da verdade. Retiraram a
tampa, e esperaram ver deslizar o conteúdo multicolor. Uma mancha cinzenta
invadiu-lhes a cara e descobriram nas suas mãos uns pequenos ossos. Nada mais existia!
O desespero dominou-os, ficaram brancos, apavorados, estupefactos. Nada
existia! Fora tudo em vão. Tinham encontrado Juno e afinal era uma nuvem. Os
ossos, sem significado, sem religiosidade material; os ossos de algum mártir ou
santo de nada valiam. O embaraço foi tão grande que um grande sinal de interrogação lhes batia agudamente.
Porquê? Porquê? Porquê?
Aguardaram um momento para respirar
melhor, sabiam que poderiam ter feito os esforços em vão; o que aconteceu de
facto.
Agora encontravam-se entalados, e só
dispunham de duas soluções: colocar a Santa no templo outra vez ou vender a
imagem; das duas hipóteses a segunda não era fácil de resolver, como a
primeira, mas poderia render algum dinheiro. Naquele momento não se encontravam
seguros de nada, mas como aquele crime tinha sido entre amigos, e permanecia em
segredo absoluto; era preferível não pensar em nada, pois já lhes sobrava em
muito a irritação de serem vencidos por uma lenda.
Quando a ilusão mergulha a pique, as
paixões são uma glória pessoal. Os dois amigos não obtiveram glória. O fracasso
habituara-os a protestar ritualmente contra as amarguras da vida. A lenda da Santa, foi como que um par de moedas encontradas à beira da estrada. Onde estão
duas moedas, podem estar três moedas, e assim sucessivamente; ponto a ponto, o
conto cresce. Depois de meses numa longa aventura aquele anticlímax era como que um
sol a agarrar-se desesperadamente à paisagem antes da noite. Foi o fracasso das
suas vidas, que os explorou até ao fim, não tinham educação para deslindar
histórias da carochinha, e o seu profissionalismo criminoso era teatro do pior.
A ignorância do velho sacristão transformada em ciência. Estava morto, mas
tinha sido ele o criador desta paixão pelo lucro rápido.
Tinham colocado uma chouriça a assar, a
gordura derretia na intimidade provincial. Rogério ciciou: - Temos de fazer
algo com esta Santa. Agora vemos isto com bastante negrura, mas amanhã
rir-nos-emos! Temos que fazer algo com a Santa, porque não a queimamos?
Edmundo não concordou, a Santa não
deveria ser restituída, mas também não deveria ser vendida, e não podia ser
queimada. De cabeça baixa e coçando a bola teve um pensamento escrupuloso. –
Vamos deixar a Santinha no cemitério! Todos conhecem a história que o teu tio,
ouviu, ou terá inventado. Alguém vai criar uma justificação para o aparecimento
da Santa.
Libertaram-se
da ilusão como uma mosca presa no papel gomado forjando uma nova lenda, sem
detalhes. Não costumavam ter ideias; mas um gosto por executar o que lhes desse
prazer. Uma fina camada de sarcasmo evitou que caíssem no desespero. Se lhe
soprassem revelaria os fantasmas, se lhe tocassem ficaríamos contaminados.
27 De Fevereiro de 2005
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